Entenda sobre a crise ambiental na Amazônia e os impactos em Roraima
Por Glenda Dinelly - Editoria Meio Ambiente e Ciência - Editor Willians Dias
Foto: Paulo Whitaker
Pare o mundo, queremos descer.
São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 2019. Início de mais uma semana, quando uma grande nuvem de fumaça deixa a maior cidade do país literalmente no escuro, o tempo já havia amanhecido estranho naquele dia em diversas cidades do Estado de São Paulo.
O céu estava totalmente preto e nas redes sociais este foi o assunto do momento. Afinal, o que haveria acontecido com o sol naquela tarde por volta das 15h? Teria sido ele desligado?
Havia uma explicação mais coerente para esse fenômeno, entre diversas outras, a versão do portal meteorológico ClimaTempo, em texto assinado pela meteorologista Josélia Pegorim explicando porque essa estranheza e atipicidade no tempo levaram muitos a pensar que o "mundo ia acabar". Havia, segundo ela, uma combinação de fumaça, umidades trazidas pela frente fria, densa camada de nuvens baixas e carregadas aliadas a forte névoa que prejudicavam a visibilidade.
Sangue, sonho (fogo) e América do Sul.
Bolívia, Rondônia, Acre, Paraguai e norte da Argentina. A explicação para tais nuvens estava nos focos de queimadas que há diversos dias se alastravam por essas regiões. A fumaça desses focos foi levada pelos ventos das camadas mais elevadas da atmosfera, explica Pegorim. Além de São Paulo, o sul do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná também puderam perceber as mudanças no tempo.
O fato de São Paulo ter ficado no escuro em pleno dia, serviu como um alerta, tal fenômeno representaria simbolicamente um presságio de acontecimentos ambientais já descortinados: o crescente desmatamento da amazônia, que em julho de 2019 cresceu 278%, em comparação com o mesmo período em 2018, conforme dados do sistema Deter (Detecção de Desmatamento em Tempo Real) do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Os pontos em amarelo representam os focos de desmatamento na Amazônia - INPE
Outro fato, que também está relacionado aos acontecimentos ambientais são as queimadas, que já duram dias em diversas localidades da Amazônia brasileira. Foi necessário, a maior cidade do país ficar escura para que o resto do mundo percebesse o problema que só se agrava na Amazônia.
Para Fernanda Cozendey, bióloga que já morou na Amazônia, atualmente residente no sudeste (Italva-RJ), existe um descaso com todo o meio ambiente, a nível não apenas de economia, mas de preservação. Para ela as pessoas que moram ao mais ao sul do Brasil quando se mobilizam norteiam manifestações que se dão por todo o Brasil.
E de fato, a alteração no tempo em São Paulo chamou a atenção, da mídia, das celebridades, dos governos internacionais e das pessoas comuns. Gerando uma mobilização internacional nas redes sociais com a Hashtag #PrayforAmazonia
Mudaram as estações, mas nada mudou....
O atual modelo de gestão ambiental do presidente Jair Messias Bolsonaro vem sendo duramente criticado por ambientalistas. O posicionamento do chefe executivo federal em relação a demarcação de terras indígenas, que permite maior abertura para extração de minérios em regiões de áreas de proteção ambiental é um alarmante. .
Frequentemente apontada nas críticas é a flexibilização dos licenciamentos ambientais, desmonte e sucateamento de órgãos ligados a fiscalização do meio ambiente como o IBAMA, Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, além de alterações em leis importantes, como o Código Florestal (Lei n 12.651/2012).
Bolsonaro e o Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles. Foto: Reprodução/ Adriano Machado/Reuters
Outro agravante, mais recente e que reverbera esse presságio ambiental nebuloso são as mudanças no Fundo Amazônia, o fim do repasse de verbas internacionais para a proteção da Amazônia, além da relação fragilizada entre governo brasileiro, na figura de Bolsonaro e os líderes do G7. São muitos acontecimentos negativos em pouco espaço de tempo, enquanto a Amazônia queima viva.
São muitos acontecimentos negativos em pouco espaço de tempo, enquanto a Amazônia queima viva.
Além disso, a pasta do Ministério do Meio Ambiente, comandada por Ricardo Salles representaria um retrocesso? Uma vez que Salles claramente manteve posicionamento simpatizante aos ideais agropecuários, além de ser acusado pelo Ministério Público Federal por abuso econômico e uso indevido de meios de comunicação em sua campanha para deputado federal em 2018. A pergunta que paira no ar como uma nuvem de fumaça em São Paulo é se Salles na pasta do Meio Ambiente seria o mesmo que deixar o rato para tomar conta do queijo?
Material de campanha de Ricardo Salles - Foto: Reprodução
Para a servidora pública, Mônica Magalhães, esse posicionamento de Bolsonaro quanto a preservação ambiental já havia sido deixado bem claro ainda no período de campanha. Para ela Bolsonaro quer visar o crescimento agropecuário, de exportação, então o que está acontecendo agora não seria nenhuma novidade. "Eu como cidadã penso que esse é o período mais triste para o país, porque a Amazônia é nosso patrimônio. Só consigo definir esse governo em relação ao meio ambiente como desastre total. Existem desastres naturais, mas para mim esse governo é um desastre programado", comentou.
"Existem desastres naturais, mas para mim esse governo é um desastre programado"
Mônica, servidora pública.
Queimadas e crescimento agropecuário
Queimar a terra é uma prática primitiva na agricultura, o objetivo é limpar o local para um novo plantio, ou ainda para formar pastos para a criação de animais, em especial o gado. É um recurso antigo na agricultura e agropecuárias.
Em muitos casos, as consequências dessa prática podem ser desastrosas, se não forem manejadas de forma correta, o fogo pode se alastrar pela vegetação que aliada ao período de estiagem provocam incêndios florestais com dimensões de crime ambiental ou prejuízos ambientais incalculáveis para flora e fauna de um determinado bioma.
Além disso, a população também sofre com as queimadas, é grande o número de pessoas com problemas respiratórios em períodos em que as queimadas se constituem em regiões agrícolas, levando fumaça para os centros urbanos.
Segundo dados do INPE, nos primeiros cinco dias de setembro, a cidade da Amazônia brasileira que mais registrou focos de incêndio florestal foi São Felix do Xingu (PA), seguida por Lábrea (AM), Feijó (AC), Boca do Acre (AM), Porto Velho (RO), Sena Madureira (AC), Altamira (PA), Paranatinda (MT), Santana do Araguaia (PA) e Tarauacá (AC).
A cidade que mais registrou focos nesse recorte de tempo é também a cidade com 2,24 milhões de cabeça de gados, segundo dados do IBGE, o que faz de Felix do Xingu um expoente brasileiro nesse tipo de seguimento. Além disso, o mesmo município apresenta índices de alertas de desmatamentos que o colocam numa posição de segundo lugar desde março de 2019.
Existe uma relação intrínseca na tríade desmatamento-queimadas-agroindústria, já que esse processo de colocar fogo numa determinada região serve como forma de limpar o solo, conhecido como Ciclo de Desmatamento da Amazônia, tais queimadas podem ser de origem humana, de forma deliberada ou não, conforme explica o INPE.
Desmatamento e Queimadas em Roraima: o pódio que Roraima não quer
Em 2016 Roraima enfrentou o maior período de estiagem dos últimos 20 anos, o que alterou drasticamente a paisagem local, na época, tal explicação se dava pelo fenômeno El Niño, capaz de diminuir as chuvas e aumentar o calor, que facilita o número de queimadas na região, atrelado a vegetação seca natural do lavrado roraimense.
No primeiro trimestre de 2019, Roraima liderava o ranking com maior focos de queimadas no território Brasileiro, conforme dados do INPE. Por conta da cultura de queimadas na região, o Estado de Roraima produziu o Calendário de Queimadas elaborado pela FEMARH - Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos e o Corpo de Bombeiros Militar, que visava controlar as atividades com fogo nas propriedade rurais para a preparação da terra para a agricultura. No entanto, o calendário foi suspenso.
Dados de Roraima
Segundo Boletim Hidroclimático da FEMARH de 6 de setembro de 2019, a previsão de chuva para os próximos meses em Roraima é considerada normal. O mês de setembro ainda não chegou a sua primeira quinzena, por isso para esse mês foram registrados apenas 3 focos de queima, totalizando 4.614 focos no ano até agora, a previsão de risco de fogo é considerada de baixo a médio, no noroeste de Roraima, o que explicaria o fato de Roraima não estar no rol dos Estados afetados pela crise Ambiental de Queimadas.
Conforme dados do TerraBrasilis, plataforma desenvolvida pelo INPE para organização e acesso de informações relativas ao monitoramento ambiental no Brasil, de 1 de janeiro até 20 de agosto de 2019, Roraima ocupava a terceira colocação entre os estados da Amazônia Legal que mais desmataram em 2019, por km², um total de 1528,30 km².
Ainda conforme ao sistema de monitoramento, o município de Mucajaí (RR) já ocupa o terceiro lugar com maiores áreas de desmatamento, entre 03 a 31 de agosto de 2019. E a Floresta Nacional de Roraima já lidera a segunda posição em km² de desmatamento em áreas de proteção ambiental.
Joga pedra na Geni.
.Ao participar de uma reunião realizada em Letícia, no último dia 6 de setembro de 2019, na Colômbia, por meio de videconferência, Bolsonaro alertou sobre uma possível internacionalização da Amazônia, e defendeu a soberania dos países Amazônicos, além de críticas a Emmanuel Macron, presidente Francês.
R.S, servidor público diz não estar impressionado com o que vem acontecendo na Amazônia, pois já era previsível, já que Bolsonaro tem como guru intelectual Olavo de Carvalho, escritor que acredita não haver aquecimento global. " A atual política do Governo Federal é muito clara, o Presidente Jair Bolsonaro já sinalizava que a intenção dele era explorar a Amazônia." Disse. Para o servidor público, a política de gestão ambiental de Bolsonaro visa a exploração.
De fato, a postura de Bolsonaro antes mesmo de se tornar presidente sempre apontou para o agronegócio, enfraquecimento de mecanismos de fiscalização e diminuição de leis protetivas para Amazônia, e até negou o aquecimento global, negou o aumento do desmatamento descreditando os Institutos de Pesquisas Brasileiros. O discurso mudou quando numa tarde segunda-feira o céu na cidade mais rica do Brasil ficou escuro, passou-se então a buscar culpados, as ONG's.
O posicionamento do atual presidente quanto a Amazônia, além de críticas internas e internacionais, tem gerado certa preocupação aos opositores, uma vez que seu ponto de vista mais direitista aponta o Brasil para um distanciamento e isolamento político.
Assim como na canção, seria a Amazônia a nossa Geni e o Governo desde Cabral o Zepelim?
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