Relatório lançado nesta quinta-feira mostra a importância de garantir posse dessa população sobre seus territórios em áreas florestais
Fonte: O Globo
Os povos indígenas são os melhores guardiões das florestas da América Latina e do Caribe quando comparados aos responsáveis por outras florestas da região. É o que aponta o novo relatório "Governança florestal por povos indígenas e tribais", da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) e do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (Filac).
O documento, baseado em uma revisão de mais de 300 estudos publicados nos últimos 20 anos, será lançado globalmente nesta quinta-feira, 25, em entrevista coletiva. O relatório defende ainda que governos exerçam ações como fortalecimento da colaboração com povos indígenas para melhorar a governança das florestas, reforcem direitos territoriais coletivos, compensem as comunidades indígenas pelos serviços ambientais que prestam, entre outras medidas.
Para David Kaimowitz, gerente de Instalações Florestais e Agrícolas da FAO, a demarcação e a titulação de terras são o primeiro passo fundamental:
— Nos territórios que já possuem título, é fundamental impedir invasões ilegais e apoiar o manejo florestal indígena. Esperamos convencer os governos com argumentos jurídicos, ambientais, econômicos e sociais. É importante que os governos latino-americanos estejam cientes de que têm obrigações legais de acordo com suas constituições e leis e tratados internacionais para garantir os direitos dos povos indígenas sobre seus territórios.
Segundo a análise, as taxas de desmatamento na América Latina e no Caribe são significativamente mais baixas em territórios indígenas onde esses povos tiveram os direitos coletivos à terra reconhecidos pelo governo. Isso indica, de acordo com a pesquisa, que assegurar a posse desses territórios é uma maneira eficiente e econômica de reduzir emissões de carbono.
Outro ponto em destaque no relatório é que o papel de proteção dos povos indígenas está cada vez mais em risco, em um momento em que a Amazônia chega a um ponto crítico, com impactos preocupantes sobre as chuvas e a temperatura e, eventualmente, sobre a produção de alimentos e o clima global.
Para Julio Berdegué, representante regional da FAO, os povos indígenas e tribais e as florestas em seus territórios desempenham papéis vitais na ação climática global e regional e no combate à pobreza, fome e desnutrição:
— Seus territórios contêm cerca de um terço de todo o carbono armazenado nas florestas da América Latina e do Caribe e 14% do carbono armazenado nas florestas tropicais em todo o mundo.
Territórios indígenas com títulos legais coletivos reconhecidos sobre suas terras foram os que apresentaram melhores resultados. Entre 2000 e 2012, as taxas de desmatamento nesses territórios na Amazônia boliviana, brasileira e colombiana ficaram entre a metade e um terço das taxas de outras áreas de florestas com características ecológicas semelhantes.
O relatório também defende que os governos devem investir em projetos de fortalecimento da atuação de povos indígenas nas florestas, reforçar os direitos territoriais comuns, facilitar o manejo florestal comunitário, fortalecer as culturas e conhecimentos tradicionais e estimular a governança territorial, além de apoiar as organizações de povos indígenas.
Menores taxas de desmatamento
Um dos estudos analisados no relatório destaca a importância de garantir a propriedade da terra: a taxa de desmatamento dentro das matas indígenas onde a propriedade foi garantida foi 2,8 vezes menor do que fora dessas áreas na Bolívia; 2,5 vezes menor no Brasil e duas vezes menor na Colômbia.
Territórios coletivos titulados evitaram entre 42,8 e 59,7 milhões de toneladas métricas (MtC) de emissões de CO2 a cada ano nesses três países, o equivalente a tirar de circulação entre 9 e 12,6 milhões de veículos por um ano.
Apesar de contribuírem com a biodiversidade, dos 404 milhões de hectares ocupados pelos povos indígenas, os governos reconheceram formalmente a propriedade coletiva ou direitos de usufruto sobre aproximadamente 269 milhões de hectares.
O relatório afirma que os custos de proteção de terras indígenas são cinco a 42 vezes menores do que os custos médios de CO2 evitado por meio da captura e armazenamento de carbono fóssil para usinas movidas a carvão e gás.
Os povos indígenas e tribais estão envolvidos na governança comum de 320 a 380 milhões de hectares de florestas na região, que armazenam cerca de 34 bilhões de toneladas métricas de carbono, mais do que todas as florestas da Indonésia ou da República Democrática do Congo.
Enquanto os territórios indígenas da Bacia Amazônica perderam menos de 0,3% do carbono em suas florestas entre 2003 e 2016, as áreas protegidas não indígenas perderam 0,6%, e outras áreas que não eram terras indígenas nem áreas protegidas perderam 3,6%. Em praticamente todos os países da América Latina, territórios indígenas e tribais têm taxas de desmatamento mais baixas.
Apesar de os territórios indígenas cobrirem 28% da Bacia Amazônica, eles geraram 2,6% das emissões de carbono relacionadas à destruição das florestas na região. Os povos indígenas e tribais não praticam muito a pecuária extensiva nem se dedicam à agricultura mecanizada, duas das principais causas das perdas florestais na região.
A América Latina foi uma região pioneira no reconhecimento dos direitos territoriais comuns do povos indígenas e tribais, manejo florestal comunitário e pagamentos por serviços ambientais, medidas que ajudaram a proteger as florestas.
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