Por Roger Miller
É muito comum em rodas de conversa sobre a política brasileira, ouvir a frase: “O povo esquece muito rápido”. E definitivamente, nas últimas duas décadas isso pôde ser comprovado. O Brasil ocupa a 96ª posição em um Ranking de países menos corruptos do estudo da Transparência Internacional realizado em 2017.
Segundo dados do Ministério Público Eleitoral nas eleições de 2018 mais de 700 candidaturas foram barradas pela Lei da Ficha Limpa. No entanto, antes da aprovação da Lei da Ficha Limpa em junho de 2010, era muito comum ver políticos envolvidos em escândalos de corrupção entrar e sair de cargos políticos.
Em muitos casos, esses políticos davam um “tempo” da vida política para que a população esquecesse os seus “podres” e tempos depois voltavam pedindo votos como se nada tivesse acontecido, e a população na maioria das vezes embalada sob o argumento do “rouba, mas faz” os elegiam novamente, novamente e novamente. Foi assim por muitos anos, até a aprovação da Lei da ficha limpa.
Uma luz no fim do túnel
No resultado das eleições de 2018, surge o primeiro indício de que há sim uma luz no fim do túnel, de que nem tudo está perdido e que o eleitor brasileiro ainda tem jeito. Embora seja apenas o começo de um “acordar”, o brasileiro se enche de esperança.
No pleito de 2018, eleitores de todo o Brasil varreram nomes importantes e influentes da política brasileira, políticos com uma longa estrada na vida pública, políticos que participaram dos quatro últimos Governos Federais, e uma família inteira de políticos, como é caso da família Sarney no Maranhão.
Em Roraima não foi diferente do restante do país, o eleitor roraimense mostrou que está atento e bem mais rigoroso, e também eliminou nomes importantes da política roraimense, mas embora tenha feito tudo isso, parte do eleitor roraimense embalado mais uma vez sob o argumento do “rouba, mas faz” cometeu alguns deslizes e elegeu novamente nomes carimbados da velha política de Roraima, o que comprova que o eleitor, de certa forma, esquece rápido das falcatruas, escândalos e vexames que vários políticos se envolvem.
Roraima é um estado jovem, criado em 05 de outubro de 1988, tem apenas 30 anos, o que torna sua política jovem, com pouca história política comparada aos demais estados. Mas isso não foi entrave para que nesses 30 anos de criação a política roraimense fizesse grandes nomes, políticos tradicionais, políticos respeitados e também muitos, muitos políticos corruptos.
O primeiro governo Campos
Neudo Campos nasceu em Roraima, em 1946, filho de políticos tradicionais do Estado, estudou em alguns colégios de Roraima, mas foi em Belém do Pará que Neudo concluiu o segundo grau e se formou em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Pará.
Em 1990 Neudo Campos candidatou-se ao governo do Estado de Roraima pela primeira vez. Naquele ano Neudo Campos foi derrotado nas urnas ficando em 4º lugar. Na ocasião Otomar Pinto foi eleito o primeiro governador do recém-criado Estado de Roraima.
Quatro anos se passaram e novamente Neudo Campos se candidatou ao Governo de Roraima, enfrentou nomes importantes da política roraimense como Getúlio Cruz e Airton Dias, mas dessa vez obteve êxito e foi eleito governador de Roraima com 35.805 votos, assumindo em 1995 o comando do Estado.
Começava naquele ano, uns dos governos mais marcantes da história de Roraima, no sentido literal da palavra.
No primeiro mandato, Neudo tratou de viabilizar avanços importantes para o jovem Estado de Roraima, avanços estes que garantiram sua reeleição para o Governo do Estado em 1998, quando derrotou Teresa Surita e Marluce Pinto nas urnas, e assumiu em 1999 o seu segundo mandato.
Dentre o elenco de grandes conquistas realizadas nos dois mandatos de Neudo, estão: o asfaltamento da BR-174 entre o Município de Caracaraí e o Amazonas, a implantação do Linhão de Guri que “livrou” Roraima do apagão, a construção e inauguração das escolas padrão, realizou os primeiros concursos na área da Educação e Segurança, implantou dezenas de programas sociais, e criou programas de conjuntos habitacionais, o bem-morar, que entregou centenas de casas a pessoas que não possuíam uma moradia.
Esses e muitos outros foram os feitos que marcaram positivamente o governo Neudo Campos que encerrou em 2002, e que seriam no futuro seus principais argumentos de campanhas.
Mas a história dos Campos na política roraimense não parava por ali, em 2006 Neudo Campos candidatou-se ao cargo de Deputado Federal, sendo eleito com 16.211 votos. Assumiu em 2007 seu cargo na Câmara dos Deputados, exerceu dois anos do seu mandato e renunciou o cargo em 2010 em uma tentativa de trazer para primeira estância o julgamento final de um processo respondido pelo então Deputado.
O primeiro declínio dos Campos
Nem só de conquistas e grandes feitos foram os dois mandatos de Neudo Campos frente ao Governo do Estado, antes mesmo de tentar a reeleição em 1998, Neudo já vinha sendo acusado de montar um esquema de corrupção na Codesaima, o que não o impediu de ser reeleito.
Mas em 2003 veio à tona o caso dos servidores fantasma da folha de pagamento do Estado que ficaria conhecido como o “Escândalo dos gafanhotos”. Um dos maiores esquemas de desvios de dinheiro público do Brasil e o maior do Estado de Roraima.
No esquema, mais de 5.000 servidores foram “contratados” e lotados em diversos setores da administração do Estado, mas na verdade, essa lotação nunca existiu, e esses servidores nunca desempenharam as funções para qual haviam sido contratados. Uma vez que diante da inclusão dos servidores à folha de pagamento do Estado, os articuladores do esquema assinavam procurações, faziam o saque do pagamento e repassavam uma quantia mínima aos titulares das contas.
O esquema funcionou entre os anos de 1998 e 2003 e desviou aproximadamente 70 milhões de reais dos cofres públicos do Estado. Neudo Campos na época foi acusado de ser o articulador do esquema que beneficiou parlamentares, funcionários do alto escalão do Executivo do Estado, do Tribunal de Contas, e o próprio governador Neudo Campos.
Em 2011, ex-governador de Roraima Neudo Campos foi condenado a 16 anos de prisão por crimes de peculato e formação de quadrilha, pelo envolvimento no caso dos gafanhotos.
Suely Campos inicia a vida política
Em meio a tantos escândalos e processos envolvendo o marido Neudo Campos, Suely Campos, a ex-primeira-dama iniciava sua carreira na política roraimense.
Nas eleições de 2002, Suely Campos candidatou-se para o cargo de Deputada Federal, e foi eleita com 7.280 votos. Suely exerceu o cargo de Deputada Federal até 2006. Os feitos e conquistas realizados enquanto Deputada Federal em Roraima lhe renderam um convite para compor a chapa como Vice-Prefeita do então candidato e reeleição Iradilson Sampaio para Prefeito de Boa Vista em 2008.
Na ocasião, Iradilson Sampaio foi reeleito prefeito de Boa Vista e Suely Vice-Prefeita. Os quatro anos de mandato de Iradilson e Suely não foram fáceis, marcado pelo aumento da criminalidade na Cidade, a falta de limpeza das ruas da cidade e caos na Saúde e Educação do Município fizeram com que a Gestão de Iradilson e Suely Campos se tornasse uma das piores da Capital de Roraima.
A segunda chance da família Campos
Neudo Campos tentou nas eleições de 2010 mais uma vez, conquistar o cargo político mais alto do Estado, o governo. Dessa vez enfrentando o então candidato a reeleição Anchieta Junior. O ex-governador levou a melhor no primeiro turno, mas não o suficiente para ser eleito. As eleições foram para o segundo turno e Anchieta Junior levou a melhor, sendo eleito com 107.466 votos contra 105.707 de Neudo Campos.
Eis que em 2014 surge uma nova oportunidade de o governo do Estado voltar para o comando da família Campos. Neudo iniciou sua campanha para o Governo do Estado ciente do seu impedimento para assumir o governo, mas não se intimidou, fez tudo o que tinha que fazer, e seguiu o script até onde deu.
A essas alturas, o eleitorado roraimense, pelo menos boa parte, já tinha “esquecido” os escândalos envolvendo o ex-governador e muitos deles até o colocavam como a salvação e solução dos problemas enfrentados pelo seu concorrente e candidato a reeleição, Chico Rodrigues.
No entanto, como já era previsto, Neudo Campos foi barrado pela Lei da Ficha Limpa e passou a bola para sua esposa Suely Campos que assumiu a campanha a 20 dias das eleições.
Os roraimenses, reforçando a premissa do “esquecimento” e embalados mais uma vez pelo argumento “rouba, mas faz” resolveram dá mais uma chance a família Campos e elegeram Suely Campos nas eleições de 2014, a primeira mulher governadora do Estado de Roraima.
Suely Campos teve muitas conquistas em seu mandato, realizou concursos, militarizou escolas, livrou Roraima da Febre aftosa, além de outras conquistas, mas nada de muito significante considerando a situação atual do Estado, e os progressos que Roraima tanta clama.
A punição exemplar
Reforçando a ideia de que “nem tudo está perdido” o eleitor roraimense resolveu punir a atual governadora e candidata a reeleição Suely Campos, nas eleições de 2018, pela péssima gestão, não a elegendo e nem a levando ao segundo turno. Suely Campos obteve apenas 29.888 votos, ficando atrás do ex-governador Anchieta Junior e do novato Antônio Denarium.
E como se não bastassem todos os problemas enfrentados pela sua gestão, que não foram poucos, como por exemplo, a crise migratória e a insegurança energética do Estado, Suely Campos teve de enfrentar um último e um dos piores problemas do Governo do Estado, o pagamento dos servidores públicos do Estado, ou melhor, o não pagamento ou a falta de verba para o procedimento.
Suely, não poderia terminar seu mandato de forma pior. Fugindo de entrevistas, de negociações e até ouvindo pedidos de renúncias.
O futuro dos Campos na política roraimense
Suely Campos encerra o seu mandato no dia 31 de dezembro e passa o bastão para o governador eleito, Antônio Denarium. E após isso, surgem algumas incógnitas. Seria o fim da família Campos na política de Roraima? O eleitorado roraimense daria mais uma chance daqui a alguns anos?
Partindo da premissa de que o eleitor brasileiro, inclusive o roraimense está mais atento e mais rigoroso, e considerando que esse rigor só aumentará com o passar dos anos, e considerando também a ausência da participação efetiva de outros membros da família Campos na política, será difícil ver “o ressurgimento” da família Campos na política roraimense.
No entanto, esta não é nunca será uma hipótese descartada. Só o tempo e a vontade politica de um deles dirá, se este foi o fim da participação dos Campos na Política roraimense, bem como aconteceu com a família Pinto após a morte de Otomar em 2007.
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