“Não há uma decisão certa ou uma errada”. De forma ambígua, Dias Tofolli, ministro do Supremo Tribunal Federal, inicia sua fala no julgamento pelo habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Por trás desse discurso, uma decisão judicial que legitima os interesses da classe média-alta brasileira. O último lance no ritual golpista, de impedir a candidatura de Lula às eleições de 2018. Decisão essa, já esperada pelo povo brasileiro ao passo que os julgamentos no Brasil são altamente parciais, através de uma justiça ligada à interesses políticos-partidários.
Lula foi condenado há 12 anos e 1 mês por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex em Guarujá (SP), vinculado às investigações da Lava-Jato. A negação da liminar que impede a prisão do ex-presidente garante a execução imediata da pena em até uma semana e meia. A defesa de Lula já manifestou a intenção de apresentar um segundo recurso ao TRF-4, e tem até o dia 10 de abril para fazer os trâmites. Mas esse recurso não garante uma revogação da pena, uma vez que o responsável pela avaliação é Sérgio Moro, justamente quem condenou Lula na primeira e segunda instância.
Mesmo com os argumentos apresentados pelo advogado Roberto Batochio, de inviabilidade constitucional da negação do pedido de habeas corpus, que prevê a execução da pena somente após esgotados todos os recursos da Justiça, o Supremo aprovou a pena com 6 dos 11 votos dos ministros. Os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello, votaram à favor ao habeas corpus, e os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Luiz Fux rejeitaram a ação. Assim, o voto decisivo para o desempate foi o da presidenta do STF, Cármen Lúcia.
Os ministros Celso de Mello, Lewandowski e Aurélio Mello foram os mais enfáticos na constitucionalidade do habeas corpus que garantiria a Lula recorrer o processo em liberdade até uma decisão definitiva do STF. Lewandowski defendeu o resguardo de Lula por presunção de inocência e o direito à liberdade, enfatizando que a negação era um irreparável retrocesso internacional. “A prisão é sempre a exceção e a liberdade é uma regra”.
Um voto inesperado à favor da pauta foi o de Gilmar Mendes, que em seu posicionamento problematizou a cobertura espetacular e violenta da mídia tradicional. Especialmente o Grupo Globo frente ao cenário político nacional, que se utiliza constantemente de um discurso de ódio para construir sua narrativa. Com o mesmo argumento, criticou a postura do PT e de suas principais lideranças com atos classificados como “violentos”.
Os defensores da pauta se legitimaram através do art. 5º, LVII, da Constituição Federal, onde se dispõe que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Tal dispositivo contempla o princípio da presunção de inocência – ou seja, é o que garante a inocência do réu em julgamento até o esgotamento de todos os recursos nos tribunais superiores.
Para o ministro Celso de Mello “nada compensa a ruptura da ordem constitucional”, esse depoimento se refere ao seu repúdio à declaração do General Villas Boas no Twitter, que foi a fala que abriu seu depoimento. Mello ainda aponta que o ex-presidente está sofrendo uma perseguição estatal para incriminá-lo, ressaltando que é “justa e profunda a indignação da sociedade civil sobre a falta ética do poder e da ética do direito”.
Marco Aurélio, que também votou em favor do habeas corpus, apontou duas declaratórias de inconstitucionalidade contra a execução, e declarou que os julgamentos estavam sendo feitos pela capa. “Meu dever maior não é atender a maioria indignada, é tornar equivalente a lei maior, a constituição”.
Por outro lado, o que ficou expresso na fala dos ministros que se posicionaram contra o habeas corpus, foi a histórica impunidade da justiça. Segundo eles, a impunidade gera uma sensação de fazer “justiça com as próprias mãos” por parte da população, e um descrédito ao sistema judiciário brasileiro. Seguindo métodos contraditórios, pautados em experiência empíricas, o ministro Roberto Barroso defendeu que em 99% dos casos levados para segunda instância mantém o mesmo parecer da primeira instância.
Alexandre de Moraes – ministro indicado por Michel Temer após o impedimento da Dilma Rousseff – ignora a ilegalidade ou abuso de poder para conceder o habeas corpus à Lula. Segundo ele, “o juízo de culpabilidade do réu foi comprovada em dupla instância”, o que já garante a legitimidade do julgamento sem a necessidade de outras análises. O advogado do ex-presidente, Roberto Batochio, contrapôs o ministro com o argumento pela falta de abordagem da presunção de inocência.
O voto da ministra Rosa Weber – o quinto e também o mais aguardado da sessão por não ter uma resultado pré-definido – foi de encontro às expectativas da base popular. Mesmo defendendo que todos os embargos de declaração deveriam ser analisados, o voto da ministra seguiu com a maioria dos votos anteriores. “Vozes individuais vão cedendo em detrimento a vozes institucionais”. Um posicionamento contraditório, pois seu voto era crucial para evitar o empate, e decisivo no que se refere à aprovação do julgamento em liberdade de Lula.
Como já esperado, o ministro Edson Fachin considerou que não existe uma motivação para que o habeas corpus a Lula fosse aprovado. Para ele, o réu não é vítima de abuso de poder e tampouco um atentado aos Direitos Humanos. “A ilegalidade apontada não merece ser reconhecida”, argumentou o ministro perante a cessão.
A finalização do processo foi de responsabilidade da ministra Cármen Lúcia. Seu voto contra o habeas corpus já tinha sido declarado anteriormente, com argumento principal de manutenção da sua postura desde 2009 ao julgar os crimes de corrupção levados ao STF.
Em um cenário democrático fragilizado, com as recentes declarações do General Villas Boas, interventor militar do Rio, e um possível agitamento popular de Esquerda, o cenário político brasileiro fica ainda mais instável e perigosamente perto de 64.
Foto: STF realiza julgamento sobre habeas corpus de Lula (Crédito: AFP)